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Marco Alcane
Nasci no Brasil, país paradigmático em seus extremos de pobreza e fausto, generosidade e perversidades.
Não me considero escritor na concepção que se dá ao termo, mas apenas me propus a expor algumas reflexões sobre a realidade, sob a minha ótica de estranhamento desse nosso cotidiano pelo avesso, que é assim torto exatamente para poder acomodar privilégios e exteriorizações de arrogâncias e de excentricidades.
Sendo o espaço acadêmico extremamente infenso ao livre pensar – a uma racionalidade não alinhada aos métodos consagrados – o caminho que escolhi para este meu exercício de exposição e reflexão foi o da literatura, mais precisamente de uma literatura aparentemente despida de pretensões eruditas, estribada apenas na narrativa de histórias dirigidas ao entretenimento ocasional do leitor.
A escolha do gênero policial – reputada como literatura menor – me pareceu a mais indicada, uma vez que no país é pouco exercitada pelos nossos escritores e menos ainda difundida, pois que raramente é alvo de análises da nossa crítica ou da atenção da nossa mídia. É, também, uma forma de homenagear o decano da narrativa policial, o Luiz Lopes Coelho, cujas obras vão além das tramas policialescas, inseridas que estão de um rico acervo de relações humanas. É neste roteiro que enveredei, procurando consolidar as diversas tramas policiais com os dramas que a sociedade brasileira está enredada em seu cotidiano.
Neste meu particular projeto literário, o personagem principal é um delegado de polícia extremamente decepcionado com o sistema e que se aposenta precocemente em função de um diagnóstico de depressão. Ironicamente, logo após, por um fato fortuito, acerta na loteria e, usando as facilidades que o dinheiro proporciona, decide atuar por conta própria investigando alguns crimes que lhe chamam a atenção ou que se vê direta ou indiretamente envolvido.
Neste roteiro escrevi 40 livros que circunscrevem a vida do personagem André Emmer, sendo que o primeiro tomo tem por título “Emmer decide viver” e o último um previsível “Emmer decide morrer”, para, com isso, encerrar em definitivo a missão, que considero cumprida, dentro das circunstâncias e na medida do meu limitado talento.
O presente texto é o único que levo a público (além dos livros), pois acredito que nada mais de importante pode ser feito ou dito que tenha o poder de mudar o conteúdo da minha modesta obra. Considero iníquo um proceder que faça uso de argumentos ou notícias para a promoção de obras de cunho artístico (além da própria obra) e desde já desautorizo quaisquer notícias sobre a minha privacidade que, pela própria etimologia da palavra (privatus – pertencente a si, fora do grupo ou do coletivo), não é pública e muito menos objeto de ordinária mercantilização. Isso posto, saio da vida literária e continuo perseguindo a tal felicidade, que dizem ser mais improvável que rastro de cobra ou couro de lobisomem.
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